quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Carta do exílio (cont.)

           Querida irmã,
           não sabes quão imensa foi a minha alegria ao receber tua carta após ansiosa espera. Imaginas o quanto eu gostaria que nossa distância encurtasse e pudéssemos conversar sem a presença de intermediários? Ou a dimensão da falta que sinto de poder abraçar-te e recorrer à tua eterna paciência, única que consegue tranquilizar meus exaltados ânimos nos momentos de conflito? Talvez tenhas ideia do que sinto, mesmo que esta seja ínfima perto da minha saudade. Passemos por cima disto, pois bem sei que sentes tanto a ausência quanto eu e não é justo acusar-te do contrário.
           Neste momento irei satisfazer tua curiosidade sobre o tal jovem. Não quero que te animes, não é ele nenhum amante secreto meu, talvez encontre-se um pouco enamorado por mim, mas nada que exceda a admiração em demasia, somente. Este pobre garoto segue agora comigo, não sei muito sobre a vida deste e nem posso te assegurar que é confiável, porém pelo que me respondestes em tua carta, ele pode dizer-se digno de meu respeito. Pediu-me que lhe chamasse apenas de Ben, não disse-me nem ao menos um sobrenome, isto não soa fascinante? Não te pareces alguém que gostaria de obter toda a minha confiança anteriormente e só depois revelar algum segredo tórrido e obscuro? Escuto-te, irmã, a dizer-me agora: “Não banques a sem juízo, Cristine, isto é loucura, e se estiveres na presença de um assassino?” . Mas para evitar que gastes teu tempo gostaria de lembrar-te que, no caso de sê-lo mesmo um assassino, compartilhamos da mesma baia nesse estábulo ao qual todas as pessoas estão presas. Sabes bem o porquê, não preciso repeti-lo.
           Não sei se tenho muito mais coisas a dizer-te. Vejamos... já expressei a imensidão da tua falta, já matei  tua curiosidade sobre o meu fiel escudeiro (se soubesses como tenho ânsias de rir quando penso desta maneira, ririas comigo)... Ah, e como ousou passar-me pela cabeça esquecer disto? Não vou repreender-te, tal como papai deve ter feito, sobre teus passeios noturnos. Creio que um dia o teu sufocar será tão grande quanto havia sido o meu e venhas juntar-te à mim. Preciso que acredites: o mundo fora desta prisão é centenas de vezes superior ao que imaginas. Não deixes que as ondas agarrem-te, querida, preciso de ti ao meu lado, mesmo que não fisicamente, és o meu suporte e desde sempre a única razão de não ter transformado-me em algo pior do que tornei-me visto os últimos acontecimentos.
                                                                Abraços, tão infindáveis quanto os teus,
                                                                                                                                        Cristine.

P.s.: Não vou enganar-te, observando tudo que tenho em volta sinto que meu “em breve” será além do habitual. A excitação em ver todas estas novidades, me afastando deste “teu” mundo verdadeiramente pela primeira vez, faz-me crer que posso trancar cá dentro toda a podridão e que dessa vez haverá alguém que acreditará em minha bondade, até satisfazer-me e estragar tudo novamente. Quem dera ter tão bondosa alma como a tua.
P.p.s: Esta carta não assemelha-se à mim, não é mesmo? Mas estou fazendo extremo esforço para ser o que quero e devo ser.

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