segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Carta à exilada.

        Irmãzinha,
        Qual há de ser a reação de uma pessoa ao deparar-se com o mar? Não é, de fato, a primeira vez que o encaro, já que moro de frente para ele, mas eis que agora não é dia e não enxergo viva alma, apenas acompanho o movimento lunar. Nenhum artefato está sendo barganhado, ponho-me a pensar e não me arrisco a dizer o mesmo sobre as almas que observo andando languidamente como a se oferecer. Beira o inacreditável a diferença entre a multidão calorosa em demasia que há no decorrer do dia, e o admirável silêncio quebrado apenas pelos sussurros das ondas e os sutis gemidos das damas de pouco valor. Volto-me às ondas, não achas engraçado estas serem tão puramente inocentes durante o dia e, durante a noite, tornarem-se tão hipnotizantes, tão fatidicamente atrativas? E esta areia, soterrada e aquecida por todo o tempo de claridade, encontra-se sossegada e leve como se pudesse flutuar...
        Não achas risível minha capacidade de estar sentada debaixo deste envelhecido lampião, olhando para a orla sem dar-me conta das horas ou de onde estou? Sabes, irmã, de meu mau-hábito de sair para respirar, pois em minha opinião todo e qualquer aposento é agoniante. Isto não mudou e nem há de mudar por um bom tempo. Sei que eles nunca se cansarão de me avisar sobre o perigo de ir devanear durante a noite, mas se tu estás viva e bem, o que há de vir a acontecer comigo?
        Por falar em ti... onde arranjastes tão fiel mensageiro? Papai tentou fazê-lo falar através de todos os métodos e eis que o pobre recusou-se até a última tentativa. Nossa mãe, assim como sempre, se contenta em chorar e chorar e chorar. Quando vejo-me nesta situação quase dá-me vontade de ir até onde te encontras (imagino-te tão mais alegre onde quer que estejas), mas bate-me uma imensa covardia e pego-me uma vez a mais pensando em como gostaria de ser corajosa como és, para levantar minha voz e ir-me embora daqui de vez. Mas há o que me console... as tuas cartas são um exemplo disto, se até hoje não entreguei-me às forças invisíveis que insistem em me puxar para o mar, devo-te até o último fio de cabelo.
        Devo partir agora, não quero que minha pobre escrita canse teus distantes olhos que no momento em que escrevo devem estar tranquilos e adormecidos. Escrevas sempre já que não deves voltar tão cedo, mesmo que digas 'em breve'.
                                                                        Infindáveis abraços,
                                                                                        Catherine.

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