domingo, 24 de outubro de 2010

Burn

Deitada e transtornadamente sonolenta, ela apenas olhava aquela casa pegando fogo. Olhar figurativamente, porque seus olhos estavam fechados. Queimando imaginariamente porque a casa estava 'intacta'. A todo minuto alguém abria a porta, berrava no telefone, discutia no corredor e por isso fingia dormir, já que não era possível ter paz nem ao menos trancada no quarto. Se entregando, finalmente, ao monstro que sussurra tragédias ao pé de sua orelha... a qualquer momento ela colapsaria . Era inevitável e insuportável ver qualquer rosto estranho, a campainha tocava e ela arrepiava todo o seu corpo. Cada pessoa nova que visitava uma das casas era mais um motivo para que ela se trancasse em seu quarto. Por que tinha ela que conviver com tudo isso? Sentia, o tempo todo, que aquelas duas casas onde dividia o tempo não eram suas e ao mesmo tempo não conseguia sair delas. Nenhuma das duas era o seu lar.. eram, na verdade, seu inferno, paraíso de todos os seus tormentos secretos que nunca ousou nem ousaria descrever. Fonte de tudo aquilo que a deixava paranóica. Pensar que todo o seu dia era formado por pessoas excessivamente previsíveis para ela também a deixava angustiada (Sim, ela percebia o paradoxo disso).
Alguns dias, durante algumas de suas alucinações, imaginava como seria ser um livro. Estava pensando novamente nisso. Talvez até fosse divertido (ou, talvez, melhoro que estava sendo agora). Uma história escrita com início, meio e fim, onde todos podem fazer suas críticas sem serem julgados por isso; ou elogios, sem que sejam mau-interpretados por folhas de papel. E trancados a uma rotina de ser lido, emprestado, devolvido, emprestado, lido, devolvido, lido, devolvido, emprestado, etc. Pensando melhor, não seria nada divertido... pessoas desconhecidas e sem respeito, senso ou inteligência seriam capazes de lê-los da mesma maneira. NÃO, definitivamente, não. Assim como não valeria a pena continuar trancafiada aos seus traumas, assim como não poderia lidar com mais uma rotina.
Ela só tinha que sair dali, sair dali, sair dali. Mas para onde? Ela perguntou ao seu 'monstro trágico'. Isso descobriremos depois que isso aqui estiver queimando. Não leve nada, passaremos na outra casa e lá a história termina. Termina? Sim, lá você queimará junto com a mobília. Mas e as outras pessoas? Você morrerá sozinha.
E esse era o colapso pelo qual ela ardentemente esperava. Qual outra saída ela teria? Pelo menos assim aniquilaria seus fantasmas. Ou eles aniquilariam com ela.

Um comentário:

Nazo disse...

hahahhaha!
realmente interessante...ser um livro com toda certeza ia ser algo tedioso e o momento mais triste seria quando ficassemos em uma estante acumulando poeira enquanto nossas paginas passariam a ficar cada vez mais amareladas...

 
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